Outros elos pessoais

25 setembro 2010

Causas e características das manifestações em Maputo e Matola (16)

"Do rio que tudo arrasta se diz violento, porém ninguém diz violentas as margens que o comprimem" (Bertolt Brecht).
Avanço na série e nas hipóteses, continuando a apresentação das características da revolta de 1/3 deste mês, muitas das quais pontuaram também - como já salientei anteriormente - a revolta de 5 de Fevereiro de 2008:
7.Objectivo central: o objectivo central não consistiu em derrubar o Estado, teve apenas o presente como horizonte, a luta não foi contra o Estado em si, mas contra um Estado considerado distante, um Estado sentido como não sendo o desejado Estado-Pai (este é sentido percepcional a nível popular), como não sendo um Estado-redistribuidor, um Estado sentido como estando apenas ao serviço dos poderosos. Em alguns canais televisivos, surgiram pessoas com expressões do género "Queremos justiça", "Estamos a passar mal", "Tratam-nos mal", etc. Os manifestantes não estiveram contra a posse de recursos em si, mas contra a não redistribuição justa desses recursos. De forma imediata, os objectivos centrais foram dois: (1) pela destruição, pela agressão e pelo roubo, assinalar de forma imponente a revolta, o desgosto, disseminar o aviso de que as coisas tinham de mudar; (2) chamar a atenção do Estado para uma identidade, a identidade dos excluídos que vivem nas periferias urbanas. É como se as pessoas se sentissem vítimas de um mal simbólico-urbano do tipo leões de Muidumbe e procurassem exorcizá-lo, condenando os seus proprietários.
8.Significado catárquico do pneu: saído dos bairros onde joga um papel cultural fundamental a vários níveis, designadamente ao nível lúdico das nossas crianças, o pneu tornou-se uma das figuras centrais da revolta. Préfiguração do carro que não se possui, do mercedes benz do centro urbano, incendiado, colocado nas vias públicas, o pneu em chamas constituiu-se como o símbolo do protesto e da catarse. É esse pneu incendiado que, nos linchamentos, assume o papel de purificação dos agravos que as comunidades dizem sentir diante dos ladrões ou de supostos ladrões (foto reproduzida daqui).
(continua)

Sem comentários:

Enviar um comentário

Seja bem-vinda (o) ao blogue "Diário de um sociólogo"! Por favor, sugira outras maneiras de analisar os fenómenos, corrija, dê pistas, indique portais, fontes, autores, etc. Não ofenda, não insulte, não ameace, não seja obsceno, não seja grosseiro, não seja arrogante, abdique dos ataques pessoais, de atentados ao bom nome, do diz-que-diz, de acusações não provadas e de generalizações abusivas, evite a propaganda, a frivolidade e a linguagem panfletária, não se desdobre em pseudónimos, no anonimato protector e provocador, não se apoie nos "perfis indisponíveis", nas perguntas mal-intencionadas, procure absolutamente identificar-se. Recuse o "ouvi dizer que..." ou "consta-me que..."Não serão tolerados comentários do tipo "A roubou o município", "B é corrupto", "O partido A está cheio de malandros", "Esta gente só sabe roubar". Serão rejeitados comentários e textos racistas, sexistas, xenófobos, etnicistas, homófobos e de intolerância religiosa. Será absolutamente recusado todo o tipo de apelos à violência. Quem quiser respostas a comentários ou quem quiser um esclarecimento, deve identificar-se plenamente, caso contrário não responderei nem esclarecerei. Fixe as regras do jogo: se você é livre de escrever o que quiser e quando quiser, eu sou livre de recusar a publicação; e se o comentário for publicado, não significa que estou de acordo com ele. Se estiver insatisfeito, boa ideia é você criar o seu blogue. Democraticamente: muito obrigado pela compreensão.