Viajo com regularidade pelas províncias.
E quanto mais viajo mais me convenço da quantidade pujante de vida plural que permeia o nosso Povo e da qual ele dá provas de historicidade diária.
Mais me convenço, sobretudo, de que ele é, na sua diversidade, um produtor constante de mestiçagens, de hibridismos culturais.
Na verdade, se estivermos atentos ao que parece ser a vida de todos os dias, verificamos com facilidade quanto as tradições se modernizam e quanto as modernidades se tradicionalizam.
No mais modesto dos actos da moçambicanidade do dia a dia, habita, na verdade, uma espécie de vitalidade browniana.
E isso mesmo ao nível daquelas entidades que, sobrehumanas, parecem ser o recurso obrigatório das gentes.
Os espíritos, por exemplo, eles também são, acreditem-me, produtores de historicidade. Os homens assim os querem e os moldam, atentos que estão à mudança, e não tenho conhecimento de que haja protesto espiritual contra isso.
Numa das províncias onde estive há alguns anos, um régulo presenteou-me com uma cerimónia de invocação de espíritos destinada ao mesmo tempo a informá-los da minha presença e a dar-me boa sorte na vida.
A invocação foi feita com pombe, cerveja da Namíbia em lata, coca-cola, três bolachas Maria e um cigarro SG.
Fiquei perfeitamente maravilhado com esse sincretismo da modernidade espírita.
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