No "Diário de Moçambique", aqui. Fenómeno secular este, sobre o qual tenho escrito neste diário. Por exemplo, em documento referente ao século XVI (poderia arrolar muitos outros documentos do mesmo género e de períodos históricos distintos, CS), Francisco Monclaro escreveu o seguinte a propósito das comunidades camponesas (muchas) do centro do país, mas, também, do Zimbabwe:
"E se acontece que algum deles é mais diligente e granjeador e por isso colhe melhor novidade e cópia de mantimento, logo lhe armam couzas falsas por onde lho tomam e comem, dizendo: porque razão haverá aquele mais milho que outro, não atribuindo isto a maior indústria e deligência, e muitas vezes por esta culpa o matam para lhe comerem tudo (...)"*
Observação: esta crença era invariavelmente expressa através de uma acusação de feitiçaria. Por outras palavras: era considerado ilícito todo o processo de acumulação realizado à margem das relações existentes, especialmente parentais. Enriquecer era ferir a comunidade, o igualitarismo aldeão. Esta é uma crença reactualizada em permanência em outras áreas do país e através de outros mecanismos de imputação. Recorde a minha série intitulada Ionge: populares acusam autoridades de prender a chuva no céu, número sete aqui. Para um excelente livro em francês que estabelece uma relação entre a feitiçaria, política e enriquecimento, consulte Geschere, Peter, Sorcellerie et politique, la viande des autres en Afrique. Paris: Karthala, 1995.
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*Monclaro, Francisco, Relação da Viagem que fizeram os Padres da Companhia de Jesus com Francisco Barreto na conquista do Monomotapa no ano de 1569, in Documenta Índica, vol. VIII, p. 683 e segs.
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