Outros elos pessoais

21 junho 2009

O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres em Maputo (16)

Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações" (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd., p. 6).
Talvez agora tenha mesmo chegado a altura de terminar esta
série, após ter decidido prossegui-la um pouco mais (veja o penúltimo número logo abaixo).
Durante vários dias, procurei sugerir-vos que o rumor do bicho-papão-nigeriano - que creio estar agora atenuado - era um envelope para exprimir vários problemas sociais, era um fusível social, era uma linguagem errada que traduzia, porém, um agregado de problemas verdadeiros, de problemas sentidos pelas pessoas.
A esse envelope foi dada uma cara que parece real, uma cara que até sugere estar doente. A esse propósito, um leitor escreveu o seguinte em comentário: "Vi as fotos da doença que o dito Nigeriano, outras vezes Somali, transmite.
Condilomas, verrugas ou coisa similar. Simplesmente estão num estado bastante desenvolvido. Não precisa ser Nigeriano ou Somali para tê-las e transmiti-las."
O rumor em causa não proliferou em meio rural, parece ser iminentemente urbano, gerando uma rápida difusão pelos mais variados meios de comunicação numa cidade - a de Maputo - inquieta, em especial femininamente inquieta, fazendo coabitar em tensão um passado que sempre se supõe mais seguro e um futuro de contornos inquietantes, uma tradicionalidade que se re-anseia e uma modernidade definitivamente instalada com seus riscos, com os seus medos e com as suas aspirações.

Adenda: tenho a suspeita de que este trabalho estraga os desejos de alguns de verem o rumor transformado em realidade. Afinal o que parece...devia ser, não é? Eis o comentário de um anónimo (ou de uma anónima) hoje deixado num dos números da série: "meu deus me espanta como vocês comentadores tem a audácia de dizer que este caso é mentira pois então me explique o caso da miúda que foi vítima será que já viram o estado do seu órgão genital? é que se tivessem visto nada disso falariam. seria inacreditavel na América, Europa, Ásia, mas tamos em África e com a quantidade de curandeiros que temos aqui, sinceramente outros falam como se fossem doutro continente e n conhecessem as maravilhas e n maravilhas do seu. vocês me metem nojo."
(fim)

9 comentários:

  1. O que mais mata não são as balas: é o obscurantismo, a ignorância.
    Não me admiraria nada se o anónimo referido na adenda fosse um dos doutores que precisam de estádios para a sua cerimónia de graduação...

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  2. professor,

    uma duvida aqui, pela estrutura que tem estado a apresentar, o factor 6 seria comunicacao e o factor 7 ostentacao.
    gostaria de saber se a ostentacao nao estaria antes dos valores? apenas uma questao de ordem que provavelmente do ponto de vista de solucao, poderia fazer diferenca.

    1- HIV (papao nigeriano 7)

    2- medo (papao nigeriano 8)

    3- representacoes negativas de estrangeiros (papao nigeriano 9)

    4- criminalidade (papao nigeriano 10)

    5- ostentacao(papao nigeriano 15)

    6- valores (papao nigeriano 11)

    7- comunicacao (papao nigeriano 13)

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  3. Obrigado, vou seriamente ponderar no que propôs.

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  4. quando a explicacao verdadeira nao agrada, inventamos a fantastica

    Jokas
    Paula

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  5. Professor Serra

    Apos a leitura aturada dos comentarios no seu blogg, interessa-me colocar a seguinte questào:

    Quais sao os alicerces da genese do rumor ou boato em torno do papao nigeriano?

    Que ligacao encontra com os modus vivendi dos nigerianos em Mocambique? ou seja podemos relacionar com os comportamento atitudes e praticas sexuais do nigerianos?

    Porque nao foram os Zimbabweanos ou Malianos por exemplo relacionados com os bichinhos?

    Porque sera que informacoes sobre o papao nigeriano sao facilmente aceites como verdade e que condicoes sociais facilitam a sua propagacao?



    Rildo Rafael

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  6. Professor

    Muitos nigerianos controlam lojas em Mocambique e grande parte destas lojas vendem roupas e calcados. Muitas raparigas por vezes trocam relacaoes sexuaias com estes nigerianos a troco de uma calca ou sapatos e grande parte destas raparigas ou mulheres tem os seus maridos mocambicanos. Sabemos da representacao que existe em torno da figura no nigeriano (pessoa de posses).

    O que mais preocupa e a mediatizacao da informacao em torno do papao nigeriano ao inves de educar e informar mesmo que ele exista de "verdade". Se nao corremos o risco de criar um problema similar da xenofobia na A. Sul ou ainda da violencia em Nampula em torno do cloro.

    Rildo Rafael

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  7. Leia a série, creio que contém as respostas que pede. "Nigeriano" é um termo gazua, termo-sombrinha.

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  8. Sinceramente meus senhores e senhoras, acreditam nessa história? ela é tão real como as imagens que algum afortunado já teve acesso do momento do acidente do Airbus da AirFrance, a net é sem dúvida uma arma perigosa ao alcance de qualquer um
    hoje pode-se fazer de tudo pela net, propagar um boato, denegrir a imagem de quem quer que seja, um expert em programas graficos pode pegar numa foto sua caro Prof em qualquer um desses países por onde o Sr. anda (de preferencia na ásia) montar lá uns tantos putos nus e publicar em como o Sr andou a fazer o que mais por lá se faz por pessoas sem escrupulos
    portanto há que ter muita atenção com o que se diz, o prof que tanto escreve sobre o assunto (até coluna tem no jornal) já aprofundou sua investigação ao ponto de manter contacto visual com alguma das vítimas, foi ao hospital falar coms os médicos? há algum caso provado? não sigamos o caminho dakeles jornais que apenas querem vender, este blog não é para fomentar boatos mas sim para estudar como tal se propaga

    Desculpa exemplo da montagem

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  9. A senhora anónima ou o senhor anónimo por acaso lê com atenção o que aqui escrevo? Dispa a exaltação e leia. E já agora: o que teme refugiando-se no anonimato?

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