Estamos, então, confrontados com este enigmático fenómeno da violência, fenómeno que, porém, parece ser simples, cristalino, tocável, rapidamente compreensível.
Em lugar de consequência de algo ou de um conjunto de fenómenos, a malfadada violência é, frequentemente, havida como uma causa, como algo que está à cabeça de tudo. Considera-se que o ser humano tem uma dose inata de religiosidade, de piedade, de amor paternal, de ciúme sexual, de agressividade, de violência, de pacifismo em tempos normais, etc. Dessa maneira tudo fica espantosamente simplificado e digerível, bastando depois adicionar uma pitada de predicação moral e de condenação veemente para o produto estar pronto a servir ao reino da alma confortada.
Quando queremos compreender a violência (ou não importa qualquer outro fenómeno social), entendemo-la frequentemente no sentido em que, outrora, explicávamos os efeitos do ópio pelas suas virtudes dormitivas, o vinho pelo espírito do vinho e o fogo pelas suas propriedades flogísticas. Por outras palavras: a violência explica-se pela violência, pelo espírito da violência, por uma substância virtualmente genética. Por outras palavras: dizemos que as pessoas são violentas porque possuem um coeficiente de violência inato, que os homens batem nas mulheres porque são violentos, que os pobres são pobres porque são preguiçosos, que a oposição política faz o que faz e diz o que diz porque é visceralmente violenta, etc.
Em última análise, em casos politicamente úteis, reorganizamos o edifício analítico, tornamo-lo de repente pacífico (porque somos pacíficos por natureza), mas introduzindo nele um dado perversamente percutor: o vírus da mão externa.
Mas vamos lá: o que é violência?
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