Sonhadores, os sociólogos sempre procuraram duas coisas: as leis do social e a reforma das sociedades. Cá por mim busco bem pouco: tirar a casca dos fenómenos e tentar perceber a alma dos gomos sociais sem esquecer que o mais difícil é compreender a casca. Aqui encontrareis um pouco de tudo: sociologia (em especial uma sociologia de intervenção rápida), filosofia, dia-a-dia, profundidade, superficialidade, ironia, poesia, fragilidade, força, mito, desnudamento de mitos, emoção e razão.
Outros elos pessoais
31 outubro 2006
Por que me interesso pelos actos humanos?
- Baruchi Spinoza
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Uma bela coisa, sem dúvida, um extraordinário manifesto de neutralidade axiológica. Mas digam-me lá, companheiros desta cruzada cognitiva: podemos realmente meter em quarentena as nossas crenças normativas, somos nós efectivamente capazes de ser spinozistas, de não rir, de não deplorar, de não detestar os actos humanos, para unicamente os compreender enquanto cientistas sociais? Creio que não. Vejam a paixão que Zico em nós despertou.
4 comentários:
Seja bem-vinda (o) ao blogue "Diário de um sociólogo"! Por favor, sugira outras maneiras de analisar os fenómenos, corrija, dê pistas, indique portais, fontes, autores, etc. Não ofenda, não insulte, não ameace, não seja obsceno, não seja grosseiro, não seja arrogante, abdique dos ataques pessoais, de atentados ao bom nome, do diz-que-diz, de acusações não provadas e de generalizações abusivas, evite a propaganda, a frivolidade e a linguagem panfletária, não se desdobre em pseudónimos, no anonimato protector e provocador, não se apoie nos "perfis indisponíveis", nas perguntas mal-intencionadas, procure absolutamente identificar-se. Recuse o "ouvi dizer que..." ou "consta-me que..."Não serão tolerados comentários do tipo "A roubou o município", "B é corrupto", "O partido A está cheio de malandros", "Esta gente só sabe roubar". Serão rejeitados comentários e textos racistas, sexistas, xenófobos, etnicistas, homófobos e de intolerância religiosa. Será absolutamente recusado todo o tipo de apelos à violência. Quem quiser respostas a comentários ou quem quiser um esclarecimento, deve identificar-se plenamente, caso contrário não responderei nem esclarecerei. Fixe as regras do jogo: se você é livre de escrever o que quiser e quando quiser, eu sou livre de recusar a publicação; e se o comentário for publicado, não significa que estou de acordo com ele. Se estiver insatisfeito, boa ideia é você criar o seu blogue. Democraticamente: muito obrigado pela compreensão.
Em resposta a Egidio e em comentario a este post:
ResponderEliminarDiscordo no seguinte - nao creio que tenhamos posicoes diferentes, creio que temos prismas e argumentos diferentes. Cada um poe peso e interesse numa dimencao (di)semelhante.
Em nenhum momento discordo do geral do seu argumento, estou e a tentar demonstrar algum aspecto interessante em algo desinteressante (ou mesmo repugnante, se insistem), na ideia que 'nao ha mal que nao vem para bem'.
Sim, e verdade que por um lado ele e predador, mas nao se recuse a aceitar que ele faz uma escolha especifica... nao fala de ricas e pobres; nao fala de macuas e makondes; fala de pretas, brancas, etc. E essa escolha especifica nao pode ser ignorada.
E tambem nao e uma questao de entende-lo, de nos compadecermos ou perdoarmos, porque somos analistas sociais... E uma questao de ver o que significa que uma musica como esta exista numa sociedade como a nossa (que pode ela oferecernos de interessante ou relevante), ou seja encontrar os significados sociais. E nao so abate-la como qualquer simples moralista faria (dai a advocacia do diabo. Parafraseando o professor: "Por isso nem sempre a construção sociológica agrada às lógicas de uns e de outros").
As coisas chocantes fazem as melhores analises sociais e desafiam nao so as nossas concepcoes, mas obrigam-nos a crescer.
Sim, temos que ser fieis a nos proprios, aos nossos ideais e as nossas crencas. Mas isso nao implica que sejamos imutaveis e que nao possamos abrir os olhos para novas opcoes e possibilidades.
Em relacao ao Spinoza, relembro-lhe, Professor, quando escreve: como cidadao nao deixo de concordar, como sociologo...
Repito: dizer que a letra da musica nao presta e facil, ninguem vai discordar de nos... Mas para construir algo relevante ha que pensar fora da caixa (literalmente 'out of the box') e desafiar a nossa imaginacao sociologica. Nao basta dizer que ta mal, tem que se dizer porque e o que fazer. E para isso nao podemos pertencer a categoria de sociologos perguntadores ou respondedores como falou o Professor. Ha que olhar dentro e tirar o que de interessante esta la. Nao foi assim que comecou o debate sobre os linchamentos? De algo que todo mundo concorda que esta mal, que esta muito mal? Hoje ja vamos em morfologias e analises sociais mais consistentes. Assim se gera vida.
Bem, no que me toca, completamente "touché". Vou vigiar melhor este cidadão que me habita e que interdita ao sociólogo uma leitura desapaixonada e apaixonado do zicoísmo. De facto, somos nós quem, em última instância, produz os Zicos.
ResponderEliminarEm tudo o que a "la strega" disse finalmente concordo.
ResponderEliminarContudo, não concordaria com ela quando, indirectamente, considerou a minha análise de ser moralista.
Considero-me uma pessoa sortuda por ter sido (e ainda sou) estudante do Professor Serra. E uma coisa que ele sempre disse - e já agora cita Spinoza - é de que não devemos "nem duvidar, nem investigar", perante actos que atentam à dignidade humana (sentido lato do termo) -dizia ele, devemos tomar uma posição. Nas suas palavras, "não duvidai, nem investigai, sejai.[Serra, Carlos (1996). Combates pela mentalidade socologica.1.ed. Maputo: Livraria Universitária.]
Portanto, não será por causa da minha posição perante este facto triste que deixarei de ser investigador para ser moralista.
Uma coisa é certa. Há aspectos de despertam atenção dentro da música do Zico. Estes deverão sim merecer um estudo/análise menos senso-comunista.
Todavia e como disse no meu blog,"Arte não implica irresponsabilidade.Mostrar e retratar a sociedade não implica a prática de obcenidades em público.
Criticar práticas discriminatórias não implica mostrar como se faz.
Enfim, á irresponsabilidade de um artista é imputável à este e não á sociedade - e já aumento - se bem que este também seja parte da última e, por analogia, protótipo dela. "Somos nós quem produz o Zico" - Serra, Carlos.
Pensei muito sobre se escreveria este ultimo comentario, ja que estamos a convergir para um consenso, mas os meus pais sempre me disseram que comecei a falar cedo e que desde entao nunca mais ninguem me conseguiu calar.
ResponderEliminarNao foi minha intencao chama-lo a si especificamente, Egidio, de moralista. Estava a referir-me a uma atitude ou argumento geral que por vezes se recusa a aprofundar um assunto por uma questao de fixacao a principios e valores pessoais. Isso e, a meu ver uma atitude moralista, a que todos estamos sujeitos. Inclusive eu.
Tambem eu nao gosto dos americanos e da sua politica externa; acho que Cahora Bassa deveria ter sido nossa desde a independencia; e considero os homens cobardes, egoistas e inconsequentes. Sou e penso assim, mas nao e isto tudo que sou ou penso. Tenho consciencia que metade da populacao americana na realidade esta comigo, na questao da politica externa; negociar uma independencia nao e tao facil, e nunca se sabe que outras opcoes estavam na mesa quando ela foi negociada; e bem, com todos os defeitos que os homens possam ter, eu sempre quererei um para meu companheiro.
Ora posto isto eu penso: realmente a letra de Zico e desqualificadora das mulheres (e atencao que eu nem tinha reparado no pormenor da albina), mas eu gosto e sempre dancei a musica. Canto ate (embora apenas quando a oico). Serei uma conformista da moda? - pergunto-me. E conhecendo-me bem sei que nao. E por isso duvido primeiro, investigo e depois sou. Ser antes de investigar implica que podemos ser resistentes a alteracao do que somos. E preciso, a meu ver, investigar sempre antes, para sermos o que somos conscientemente.
E duvidar, sempre duvidar... porque a unica permanencia do universo e a sua impermanencia. E se nao fosse pelas nossas duvidas, nao haveria conhecimento, nao haveria crecimento, nao haveria ciencia.
E ao duvidar, neste particular assunto cheguei a seguinte resposta perante o dilema de ser mulher e nao desgostar da cancao do Zico:
1) Em nenhum momento a vi mais do que mero entretenimento, sem nunca ter tentado encontrar nenhuma mensagem em particular nela (ironicamente a sua posicao - em relacao a possibilidade de a cancao conter alguma mensagem - ha uns posts atras).
2) O ritmo musical apelas a minha mocambicanidade e a minha juventude: e uma fusao entre a marrabenta e o hip-hop. E demasiado visceral para o poder recusar.
Claro que nao sou a favor dos argumentos (que tambem considero simplistas) que as pessoas sao produto da sua sociedade e atraves disso criar desculpas para os seus actos. Longe de mim. O meu argumento tem ido (espero) na direccao da relevancia, i.e. e mais relevante a meu ver perceber o contexto da possibilidade de existencia dessa cancao, do que ataca-la so por principio de solidariedade para com a causa das mulheres. Creio que o Zico pouco se importara e pouca diferenca lhe fara que lhe digam que a sua cancao e misogina. E ele nao sera o unico a faze-lo. Alguns dos musicos mais famosos do mundo fazem-no e sao largamente consumidos. Mas olharmos para nos mesmos e reflectirmos sobre se este nao e o nosso discurso enquanto sociedade e se nao e com a nossa forma de ser que permitimos que cancoes desta natureza nascam e se multipliquem e muito mais construtivo. Em ultima instancia o Zico so tera voz se tiver publico... e por enquanto ele tem e bastante. Assim como as boas almas que tentam travar os linchamentos tornam-se potenciais vitimas dos mesmos, simplesmente criticando a musica corre-se o risco de se ser vilanizado. O que se deve combater e a causa, nao o efeito (em nome da eficiencia, claro).
E nao acredito que o artista aqui prtendia mostrar ou retratar a sociedade. Creio e que a obra e acima de tudo o seu sucesso e que sao um reflexo dela.