Suponhamos o seguinte quadro: numa multidão de 200 pessoas alguém aponta A como responsável de um roubo. É previsível que uma parte das 199 pessoas restantes partilhe de imediato, sensorialmente, a acusação (vê o estigmatizado, está mais próxima dele, etc.) e que a outra seja arrastada à identificação por etapas de adesão um pouco mais lentas mas não menos imperativas e, no limite, também paroxísticas. O momento final é a identidade reactiva, a homogeneidade estigmatória, o clímax linchatório. O longo tempo de crise acumulada é percutido e exacerbado pelo tempo curto, sensorial, mimético, irreversível, da decisão. Dificilmente alguém poderá pensar com equilíbrio numa situação dessas. A componente lógica de cada um de nós é imediatamente submersa pela componente instintual. Esta última hipostasia e nivela. Isso sucede não porque um instinto de massa preexista a cada um dos participantes, mas porque cada um partilha transubjectivamente a equivalência e as osmose feitas rapidamente entre a crise e o "culpado" encontrado. O linchamento é o resultado agregado das identificações individuais. Cada um de nós pode fazer a experiência da mentalidade linchatória num jogo de futebol, especialmente num jogo vital, sentando-se onde possa seguir o comportamento de um conjunto de adeptos de uma das equipas. Ou, então, assistir ao comício de um partido em período eleitoral.
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