A crise é uma arma apetecida no combate político. Qual crise? A crise dos outros. A este propósito, é possível transformar a crise num triplo momento: (1) falsa preocupação com o mal que é suposto apoquentar os outros, (2) imensa alegria com esse mal e (3) receituário piedoso. Quando surge o que entendem ser uma crise na casa do Outro, os crisecos dão imediata conta pública do quanto estão preocupados, na superfície das preocupações navega o que parece ser um genuíno pesar, um sincero anseio pela alteridade opinativa ou comportamental. No bojo das coisas, porém, viaja uma imensa alegria com o que os crisecos entendem estar a passar-se. E entre a falsa preocupação da superfície e a nua realidade do interior - ser perversamente dúplice no cenário de uma hipócrita conversão na estrada de Damasco -, irrompe um receituário piedoso, cheio de peregrinas mezinhas do género "oiçam o que vos digo, eu sei perfeitamente o que se está a passar".
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