Carlos Serra: olá para todas e todos, espero que estejam bem de saúde. Vamos, então, dar prosseguimento ao nosso debate. O tema continua a ser conduzido pelo Geraldo, versando sobre a Renamo e, particularmente, sobre a sua génese. Abraço. Carlos
Geraldo dos Santos: vamos então continuar. Ambas as partes colhiam vantagens do processo tal como foi criado. A Rodésia do Sul e a África do Sul procuraram "domesticar" o nosso país não directamente, mas indirectamente através da Renamo. Esta foi, portanto, o seu utensílio estratégico. Por sua vez, a Renamo, formada por descontentes e dissidentes, contava com o apoio logístico estrangeiro para dar corpo ao seu protesto político por via militar. A história da Renamo é formada por duas partes: a parte da dependência em relação aos mentores e a parte da independência. Nos anos 90 a Renamo está perfeitamente independente da África do Sul, país onde, aliás, a situação política se alterou com o término formal do apartheid. A partir de 1992 a Renamo iniciou a passagem de frente guerrilheira para partido político. Hoje fico por aqui. Respeitosos cumprimentos. Geraldo
Sónia Ribeiro: ok, Geraldo. Mas, afinal, a Renamo nunca perdeu o seu músculo guerrilheiro, está-lhe no sangue. O que se está a passar no país é burlesco, é trágico, de novo ataques, mortos, feridos e destruições. E vão-me dizer que o que se passa no terreno é obra do exército governamental? Como é possível um país ter dois exércitos? Como é possível? Beijinhos aqui da terra do Zambeze e do carvão. Sónia
Félix Gorane: olhe, Sr. Poisson, o vosso passado europeu, o vosso passado de brancos, está cheio de guerras e de milhões de mortos. Vocês não têm só um Ogum, têm muitos, aliás cada um de vocês é um perfeito Ogum. Produtores de guerras nas vossas Europas e Américas, trouxeram-nas para cá, instalaram-nas cá, viciaram-nos. E depois têm o descaramento de dizer que África só tem pobres, corruptos e guerras. Que descaramento, que hipocrisia, que desfaçatez! O que é no fundo a Renamo, senão um produto historico do vosso Ares, do vosso instinto guerreiro, da vossa propensão para a morte e destruição permanentes? Tenho dito por hoje. Cumprimentos. Félix
Eu não sei o que seria deste país sem o surgimento da Renamo.
ResponderEliminarComo apreciador da História Contrafactual posso afiançar duas hipóteses:
1. Limitação das liberdades em toda a sua plenitude;
2. Continuação da pregação do sistema Marxista-Leninista, destruindo o tecido social existente no país;
A Renamo veio, independentemente de quem a financiou, estancar estas hemorragias.
Eu discordo totalmente da tese de que a Renamo surge como um "utensílio estrangeiro" para "domesticar" o país, senão vejamos:
Quando um Estado priva o seu próprio povo de todos os direitos consagradas pela Constituição e outras leis internacionais (dos quais é signatário) é dever dos mais iluminados - em nome da fiscalidade do bem - intervir para estancar a situação.
É papel dos países vizinhos, quando tal acontece, intervir para a salvação de quem está em perigo iminente de vida.
Durante muito tempo aprendi que quando há um incêndio no jardim do vizinho temos de saber emprestar a mangueira para apagar o fogo.
Foi o que aconteceu com a Renamo. Esta surge, antes de mais, da vontade do povo moçambicano em equilibrar o pêndulo da justiça.
Mais vale ter um sistema em que o "vil metal" regula o homem e a sociedade do que um sistema em que, em nome de uma falsa igualdade, mutila-se o homem e destrói-se a sociedade.
Diria o belga E.L. que "O marxismo está certo nas suas análises mas errado nas suas soluções."
Pergunta "(...) o que se passa no terreno é obra do exército governamental?" Não é do exército e sim dos políticos. Quem manda no exército?
Esta questão é tão complexa que não deve ser entendida desta forma, simplista, pois "a liberdade de dar um murro termina na face do adversário". E se esse adversário tiver armas - como é o caso da Renamo - não espere que ele fique quieto a lamber feridas.
Os problemas deste país não é a Renamo, ela é apenas a ponta do icebergue.
1. Temos uma carrada de universidades (mais do que poços de água) que formam para o desemprego. É assustador o número de desempregados existentes no país. Quer prova? Tente abrir uma empresa e lance um concurso público para ver quantos currículos irá receber. Gente que procura o primeiro emprego.
2. Todos os dias cava-se em Benga. E todos os dias o povo vê sair carvão para o mundo fora. Ora, o povo de Benga vive de tubérculos silvestres, sem água potável, sem corrente ecléctica e sem carteiras nas escolas, porque a madeira que devia vir de Cabo Delgado, da Zambézia e de outros pontos do país, tem outros destinos.
São apenas alguns exemplos.
Pergunta "Como é possível um país ter dois exércitos?" As negociações de Roma teve seus túneis, como qualquer negociações.
Vive alguns meses nos corredores da diplomacia internacional e o que vi assustou-me. A POLÍTICA É DEZ VEZES MAIS PERIGOSA DO QUE A GUERRA EM QUE SE MORRE UMA ÚNICA VEZ. EM POLÍTICA AS PESSOAS MORREM TODOS OS DIAS. OS POLÍTICOS SÃO BONS AUTORES E SABEM FAZER OS SEUS POVOS DE TABULEIRO QUANDO LHES CONVÉM. Há excepções, naturalmente.
O país têm dois exércitos porque alguém deixou e anuiu. Aliás, não são dois. São milhares. Há o exército desarmado dos desempregados, dos descontentes, dos afortunados, dos excluídos. Tudo isto conta.
Zicomo
"Uma Boa guerra é preferível à uma má Paz." [Nietsche]
ResponderEliminarE a nossa paz, Senhoras e Senhores,- se é que é lícito chamar paz a esta permanente e crescente violência social-,deita pus em toda a sua constituição. É uma paz em processo de decomposição.
E mesmo que se extermine fisica e ideologicamente a Renamo aparecerão outros moçambicanos que não aguentarão as desigualdades em escalada e a desporporção de oportunidades que se fez regra.
" Na primeira noite, eles se
aproximam e colhem uma
flor de nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não
se escondem, pisam as
flores, matam nosso cão. E
não dizemos nada.
Até que um dia, o mais
frágil deles, entra
sozinho em nossa
casa, rouba-nos a lua, e, conhecendo nosso
medo, arranca-nos a
voz da garganta. E
porque não dissemos
nada, já não podemos
dizer nada."
[Maiakovski]