Outros elos pessoais

24 fevereiro 2008

Manifestações e mão invisível: posição de João Castande

Em carta de leitor, o jurista João Baptista André Castande resolveu reflectir sobre as manifestações populares em Moçambique. Pegou num dos lados do poliedro causal, o das instituições da nossa justiça.
Começou por citar Graça Machel : “(...) Mas aqui e agora vos asseguro: a revolta é tão grande que não cabe na concha do nosso silêncio deliberadamente preservado como de ouro. E sei, vejo e ouço centenas de milhares de vozes a exprimir a mesma revolta. Estamos a romper a timidez, que nos tentaram impor. Finalmente!(...) É de medo que tentam amordaçar a verdade e as instituições feitas para servir a causa do Povo. Quão gatos escondidos com o rabo de fora. (...) Não vai tardar que eles se afoguem nas ondas da ira popular. O exército do Povo está a reerguer-se!” – Graça Machel, in Metical, edição de 23-08-2001 (nota minha, C.S.: recorde o texto completo aqui, quando Graça homenageou Samora Machel, Carlos Cardoso e António Siba Siba Macuácua em 2001).
Depois escreveu o seguinte: "A minha intervenção neste contexto surge do facto de, durante estes trinta e dois anos da independência nacional, ter aprendido que em qualquer meio social a melhor solução é aquela que resulta da extirpação da causa dos problemas e não apenas do combate aos respectivos sintomas."
A seguir: "Explicando-me melhor, devo dizer que na verdade e concordando com o jovem político e compatriota Edson Macuácua, “temos no nosso país mecanismos convencionais, formais e informais, ao nível social, jurídico e institucional que são o meio adequado para a resolução de conflitos”. Mas perante os problemas concretos que agora se nos colocam, talvez seja aconselhável fazermos um exame de consciência e interrogarmo-nos se os mecanismos em referência funcionam a contento do povo? Ou, antes pelo contrário, estão amordaçados pelas forças hostis, como outrora corajosamente denunciou a compatriota Graça Machel? O que é que falta, afinal, para que tais mecanismos de resolução de conflitos funcionem de forma aceitável?"
E finalmente: "Desta feita, a par da destruição de objectos económicos e sociais que todos nós temos razão de lamentar profundamente, é preciso que não menosprezamos a quantidade de homens que são espiritualmente destruídos pelos desvarios e desvios comportamentais de um grupelho de pessoas beneficiárias da impunidade instalada."
Adenda às 23:42: a segunda parte do trabalho de Castande é ainda mais incisiva, publicada no "Notícias" de amanhã, mas já disponível em versão online. Extracto: "Mão externa? Não é elegante que depois de declararmos “guerra” sem quartel ao burocratismo, ao espírito de deixa andar e à corrupção, por serem reconhecidamente considerados obstáculos ao desenvolvimento económico e social, chamemos de mão externa aos efeitos próprios de percurso, para justificar a nossa fraqueza e/ou incapacidade combativa. Aliás, sendo a guerra um confronto entre duas forças, o mais importante é que cada uma das partes se prepare da melhor forma para fazer face aos truques mais requintados da parte contrária. A menos que tenhamos a coragem de desmascarar o rosto da dita mão externa! Por isso, o governante tem que ser amigo e praticante consequente da justiça na sua acção quotidiana. Sugiro, assim, que no nosso país temos que começar agir contra a acumulação de muitos cargos ou postos de emprego pelo mesmo grupo de pessoas, para dar emprego a cidadãos mais necessitados e carentes. Temos que abandonar o mau hábito de sentirmo-nos bem perante o sofrimento do nosso semelhante, porquanto ordena a lei aplicável aos governantes que “o exercício de cargos governativos implica o estrito respeito da Constituição e da lei, bem como das normas de ética profissional que garantem a transparência, o prestígio e a dignidade das funções exercidas e dos respectivos titulares”. Há que deixarmos, por conseguinte, de temer e marginalizar os concidadãos que pensam, sabem, são capazes e podem, para que a nossa Pátria amada possa avançar.

3 comentários:

  1. Pois é, pois é, mas o jovem camarada Edson não quer saber disso, Dr. Castande. Importante é repetir o estafado discurso do malandreco invisível.

    ResponderEliminar
  2. Xamuáli Sara, Samora conhecia bem certos camaradas de agora.

    ResponderEliminar
  3. Não gosto de selvajeria, mas o Doutor Castande tem razão. E mais não disse.

    ResponderEliminar

Seja bem-vinda (o) ao blogue "Diário de um sociólogo"! Por favor, sugira outras maneiras de analisar os fenómenos, corrija, dê pistas, indique portais, fontes, autores, etc. Não ofenda, não insulte, não ameace, não seja obsceno, não seja grosseiro, não seja arrogante, abdique dos ataques pessoais, de atentados ao bom nome, do diz-que-diz, de acusações não provadas e de generalizações abusivas, evite a propaganda, a frivolidade e a linguagem panfletária, não se desdobre em pseudónimos, no anonimato protector e provocador, não se apoie nos "perfis indisponíveis", nas perguntas mal-intencionadas, procure absolutamente identificar-se. Recuse o "ouvi dizer que..." ou "consta-me que..."Não serão tolerados comentários do tipo "A roubou o município", "B é corrupto", "O partido A está cheio de malandros", "Esta gente só sabe roubar". Serão rejeitados comentários e textos racistas, sexistas, xenófobos, etnicistas, homófobos e de intolerância religiosa. Será absolutamente recusado todo o tipo de apelos à violência. Quem quiser respostas a comentários ou quem quiser um esclarecimento, deve identificar-se plenamente, caso contrário não responderei nem esclarecerei. Fixe as regras do jogo: se você é livre de escrever o que quiser e quando quiser, eu sou livre de recusar a publicação; e se o comentário for publicado, não significa que estou de acordo com ele. Se estiver insatisfeito, boa ideia é você criar o seu blogue. Democraticamente: muito obrigado pela compreensão.