Outros elos pessoais

25 agosto 2007

A cultura acústica dos Moçambicanos (4) (continua)

Temos, então, que José Lopes pôs de pé uma obra colossal.
Descobiu que os Moçambicanos são acústicos, esféricos, metafóricos, inclinados a montes de coisas graças ao dom do ouvido, exímios na dança, nas pausas, nas repetições, nas metáforas, nas brincadeiras, enfim, os Moçambicanos amam ouvir e contar histórias.
Um quadro edílico. Esferica e acusticamente, a tese de Lopes abrange rigorosamente desde o presidente Guebuza ao modesto camponês do Zóbuè lá na minha terra, Tete. Ambos e todos são - somos - definitivamente acústicos, incluindo, claro, o Sr. Lopes.
Os acústicos não têm fissuras, não são sujeitos às clivagens sociais, são iguais por inteiro, estudem numa modesta escola do Niassa ou façam um doutoramento no Brasil como fez o Sr. Lopes, sobrevivam num dumba-nengue ou tenham montes de empresas.
Sem dúvida que os acústicos Moçambicanos são crianças adoráveis, maravilhosas, plasticamente poéticas.
Todavia, já no século XIX o velho Hegel tinha tido essa perspicaz e genial intuição, a intuição da poliédrica infância perene, não, claro, em relação aos Moçambicanos, mas em relação a todos os Africanos. Nas suas lições sobre a filosofia da história universal, escreveu que os Africanos eram gente do "país da infância" (sic), gente imediata, vivendo no particular, não no universal, atravessando por inteiro o estado de inocência, da visão imaginativa, ocupando os dias na magia, na dança, na poligamia e no sexo, de forma pura, esquecidos da história do espírito, felizes na redoma dos seus sentidos, entregues por completo à energia pura. E se nas festas se tornavam antropófagos, isso nada tinha de anormal: a carne humana era apenas carne para os Africanos, coisa sensível, sem alma e, portanto, legitimamente comestível. Por isso a carne humana era vendível nos mercados - sustentou Hegel. Enfim, coisa natural, coisa de crianças sem consciência do espírito, puras, totais, crianças vivendo no mais perfeito "estado de inocência" (sic).
Como podiam os Africanos ver que eram antropófagos se eram e são crianças, se eram e são acústicos?
É preciso nunca esquecer que na cultura acústica a mente opera "de um outro modo", como defende Lopes, o neo-hegeliano.
E operar num outro registo, num outro modo (coisa complicada, claro, quando no "outro modo" habitam "muitos modos", diferentes, opostos) , remete para as línguas que os acústicos falam.

3 comentários:

  1. Boa Tarde Sr. Carlos Serra

    Quanto ao tema que vem desenvolvendo sobre "A cultura acústica" brilhante tese escita por José Miguel Lopes, aconselheraria ao senhor que leia com atenção devida o livro do autor em vez de julgar que pode tecer comentários vazios sobre uma temática que claramente desconhece.
    Eu li este trabalho e aínda não consegui entender a sua linha de pensamento.
    Como o Sr. diz ser sociólogo creio que seria pertinente antes de maiores argumentações lêr o trabalho primeiro e depois aí sim poder começar a esboçar algo mais cientifico.

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  2. Brilhante? De facto, só se for na segunda parte. Por falar nisso, ainda não saiu?
    ....

    Que fazer quando são os próprios africanos que se vêm como seres possivelmente «inferiores», mais próximos do acústico que do intelectual, do natural que do social, da emocão que da razão? Cada um faz a cama em que se deita. Depois, não se queixem.

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  3. Se se chama Carla Rocha, deixe-me primeiro agradecer-lhe a gentil mensagem; deixe-me, em segundo lugar, dizer-lhe que sigo com o máximo rigor possível o texto que tem saído aqui no semanário "O País"; finalmente, deixe-me dizer-lhe que fico feliz por não ter compreendido a minha linha de pensamento: isso significa que tenho de ser mais acústico. Abraço!

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