Cada vez mais parece que certas palavras se encarregam de ter vida própria, como se fossem seres sobre-humanos, como se fossem gigantescas causas independentes de nós e de relações sociais concretas: pobreza absoluta, corrupção, burocratismo, sida, etc.
Por todo o lado, não importa o nível decisório e o emissor da palavra oficial, surgem esses seres espantosos sem rosto próprio, espíritos maus que importa expurgar simbolicamente não interessando saber exactamente o que são, quem são e por que são.
Transferimos para seres fantásticos, cómodos justamente por serem fantásticos, as consequências de certas práticas sociais cujos processos não interessa ter em conta. A pobreza absoluta, por exemplo, é um mal que podemos eliminar se "todos" nós assumirmos o combate contra ela. A crença politicamente interessada é a de que a pobreza absoluta nada tem a ver com o sistema social que a segrega em permanência, mas com a falta de trabalho e de apego.
É como se, esvaziado por completo o sentido social das coisas e das pessoas que fazem coisas em relações a propósito de coisas que uns têm e outros não, transformássemos essas palavras em eléctrodos politicamente úteis. Melhor, em pacemakers que reequilibram politicamente o ritmo cardíaco da nossa vida social com pequenos choques eléctricos simbólicos, convenientes, verbais, encantadores, silenciosos e anestesiantes.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Seja bem-vinda (o) ao blogue "Diário de um sociólogo"! Por favor, sugira outras maneiras de analisar os fenómenos, corrija, dê pistas, indique portais, fontes, autores, etc. Não ofenda, não insulte, não ameace, não seja obsceno, não seja grosseiro, não seja arrogante, abdique dos ataques pessoais, de atentados ao bom nome, do diz-que-diz, de acusações não provadas e de generalizações abusivas, evite a propaganda, a frivolidade e a linguagem panfletária, não se desdobre em pseudónimos, no anonimato protector e provocador, não se apoie nos "perfis indisponíveis", nas perguntas mal-intencionadas, procure absolutamente identificar-se. Recuse o "ouvi dizer que..." ou "consta-me que..."Não serão tolerados comentários do tipo "A roubou o município", "B é corrupto", "O partido A está cheio de malandros", "Esta gente só sabe roubar". Serão rejeitados comentários e textos racistas, sexistas, xenófobos, etnicistas, homófobos e de intolerância religiosa. Será absolutamente recusado todo o tipo de apelos à violência. Quem quiser respostas a comentários ou quem quiser um esclarecimento, deve identificar-se plenamente, caso contrário não responderei nem esclarecerei. Fixe as regras do jogo: se você é livre de escrever o que quiser e quando quiser, eu sou livre de recusar a publicação; e se o comentário for publicado, não significa que estou de acordo com ele. Se estiver insatisfeito, boa ideia é você criar o seu blogue. Democraticamente: muito obrigado pela compreensão.