Outros elos pessoais

15 maio 2006

Sociólogo fala da violência no Brasil

Chama-se Loïc Wacquant, 46 anos, professor de sociologia da Universidade da Califórnia em Berkeley e pesquisador do Centro de Sociologia Europeia em Paris. Foi entrevistado sobre os acontecimentos em São Paulo:

"Folha - Por que a situação em São Paulo chegou a esse ponto?
Loïc Wacquant - Porque nas últimas décadas as elites políticas brasileiras têm usado o estado penal --polícia, tribunais e sistema judiciário-- como o único instrumento não só de controle da criminalidade como de distribuição de renda e fim da pobreza urbana.Expandir esse estado não fará nada para acabar com as causas do crime, especialmente quando o próprio governo não respeita as leis pelas quais deve zelar: a polícia de São Paulo mata mais que as polícias de todos os países da Europa juntos, e com uma quase impunidade. Os tribunais agem sabidamente com preconceito de classe e raça. E o sistema prisional é um "campo de concentração" dos muito pobres. Como você pode esperar que esse trio calamitoso ajude a estabelecer a "justiça"?A manutenção do que chamo de estado penal só faz com que a violência institucionalizada alimente a violência criminosa e faça com que as pessoas tenham medo da polícia. Cria um vácuo que o crime organizado sabe muito bem preencher. Isso permite a eles que cresçam e sejam tão poderosos e ousados a ponto de desafiar abertamente o Estado e seu monopólio do uso da violência." [*]
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[*] http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u121505.shtml

3 comentários:

  1. "A retórica política de grupos de extrema esquerda da Colômbia, da bolívia, do Peru etc, está contaminando esse pessoal (PCC), que começou a agir em redes, que não são só interestaduais, mas internacionais ou transnacionais", é o que disse a antropóloga Alba Zaluar em entrevista à Folha de São Paulo (impressa). Qual é sua opinião a respeito?

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  2. Facismo Societal e Estado-Policia

    Gostaria de chamar atenção a duas variáveis imbricadas, fundamentais na análise da criminalidade no Estado brasileiro contemporâneo: as desigualdades sociais abismais e o facismo societal. Concordo plenamente que no Brasil instaurou-se um estado-polícia-repressivo, que do ponto de vista sociológico representa os interesses da classe burguesa-capitalista. Esta lógica operacional é quase característica a maioria das sociedades capitalistas, variando não em natureza mas em grau. Como diria Ralf Dahrendorf, nestas sociedades a coesão social e mantida "não por consenso, mas por coacção, não por um acordo universal, mas pela coerção de uns sobre os outros". Até aqui não há grandes novidades. O que realmente é estonteante no Brasil, e o grau de selvajaria politica e a perversão do contrato social, aproximando-se a um autêntico hobbesiano social.
    Podemos distinguir duas zonas sociologicamente distintas: a zona da " exclusão social" onde normalmente vive a maioria dos cidadãos precarizados, e a zona do "contrato social" onde vive o conjunto de cidadãos que goza da cidadania de primeira. Na primeira o Estado está ausente por incapacidade ou falta de vontade politica e actua repressivamente no sentido de minorar o seu impacto na zona do contrato social. Na segunda, o Estado está presente com todos recursos e materiais de que dispõe. Como observa Santos "nas zonas civilizadas o Estado age democraticamente, como Estado protector, ainda quw muitas vezes ineficaz ou não confiável; nas zonas selvagens, o Esatado age facisticamente, como Estado predador, sem qualquer veleidade, mesmo aparente, do direito"
    Ademais, verifica-se que os cidadãos precarizados do Brasil nao recebem do Poder Público "razoáveis oportunidades de trabalho e de sobrevivência digna" embora lhes seja exigido a íntegra observância da lei como se, de entre várias possibilidades, optassem pelas trajectórias marginais. Paradoxalmente, o Estado exige aos cidadãos o cumprimento dos deveres, sem no entanto ele próprio, incumbir-se da sua responsabilidade plasmada na lei mãe (Constituição da República).
    Assim pela falta de legitimidade da governação, corre-se sempre o risco de se dividir a opinião pública brasileira sobre a actuação da rede criminosa. Se nas zonas do "contrato social" a PCC é reputada de "inimiga" provavelmente na zona de "exclusão social" será vista como "herói" e "libertadora" da "opressão do Estado-Facista"

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  3. Concordo absolutamente consigo. Seu remate final embora aprentemente dogmatico nao deixa de ter mto de real.
    Referindo-me à noçao de “gouvernement” chez Foucault, penso que poderiamos intrepretar o caso de Sao Paulo ( e sem duvida d’outras metropoles) dizendo que “governar” é precisamente a arte de limitar ou impedir a sobreposiçao de duas formas de fraccionamento, social e espacial.

    Iolanda Aguiar

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