Outros elos pessoais

26 abril 2006

Os Outros

Existem nos Outros moçambicanos - os excluídos do bem- reservas de esperança, de crença de que melhores dias poderão vir.
São, afinal, Outros que, apesar de tudo, lutam e que continuam a aguardar pelo paradigma de Mondlane.
De acordo com Eduardo Mondlane, primeiro presidente da Frelimo, os camponeses recusavam aderir à luta de libertação nacional nos dois primeiros anos (1964/1966), desertando e juntando-se aos Portugueses, porque o movimento não estava preparado para lhes assegurar os serviços essenciais (lojas, hospitais, escolas, administração, tribunais, etc.), anteriormente a cargo dos Portugueses.
Dessa maneira, Mondlane estava a pôr o problema político, sempre actual, do pacto social. O paradigma de Mondlane pode ser assim enunciado: se um grupo dominante controlando o Estado exige fidelidade, os cidadãos exigem a redistribuição da riqueza. Se esta é assegurada, o Estado torna-se, no sentido de Gramsci, hegemónico, no sentido de que dirige, em lugar de coagir.
Ora, quando o Estado não assegura a reciprocidade no sentido indicado, não tem cidadãos, mas súbditos a quem pode maltratar.
Os súbditos continuam a aguardar a reciprocidade, com um forte sentido apelativo. Eles fogem do Estado porque não confiam nele, mas ao mesmo tempo esperam que mude. Existem evidências de que a concepção de democracia em Moçambique está profundamente ligada à satisfação de necessidades básicas como alimentação e paz e de que essa satisfação, mormente no que concerne ao bem-estar material, passa pelos estrangeiros e não pelo Estado. Por outro lado, herdeiros de um longo passado de gestão autoritária desde a era colonial, os súbditos parecem pouco preocupados com a democracia política tal como concebida pelas élites e pelos partidos políticos. O seu sonho está na democracia "económica".
E enquanto esperam, formatados entre o que sofrem e o que sonham, frágeis e expectantes, os súbditos refugiam-se no seu mundo, o mundo do informal, com um ponto de interrogação todos os dias plantado no seu futuro.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Seja bem-vinda (o) ao blogue "Diário de um sociólogo"! Por favor, sugira outras maneiras de analisar os fenómenos, corrija, dê pistas, indique portais, fontes, autores, etc. Não ofenda, não insulte, não ameace, não seja obsceno, não seja grosseiro, não seja arrogante, abdique dos ataques pessoais, de atentados ao bom nome, do diz-que-diz, de acusações não provadas e de generalizações abusivas, evite a propaganda, a frivolidade e a linguagem panfletária, não se desdobre em pseudónimos, no anonimato protector e provocador, não se apoie nos "perfis indisponíveis", nas perguntas mal-intencionadas, procure absolutamente identificar-se. Recuse o "ouvi dizer que..." ou "consta-me que..."Não serão tolerados comentários do tipo "A roubou o município", "B é corrupto", "O partido A está cheio de malandros", "Esta gente só sabe roubar". Serão rejeitados comentários e textos racistas, sexistas, xenófobos, etnicistas, homófobos e de intolerância religiosa. Será absolutamente recusado todo o tipo de apelos à violência. Quem quiser respostas a comentários ou quem quiser um esclarecimento, deve identificar-se plenamente, caso contrário não responderei nem esclarecerei. Fixe as regras do jogo: se você é livre de escrever o que quiser e quando quiser, eu sou livre de recusar a publicação; e se o comentário for publicado, não significa que estou de acordo com ele. Se estiver insatisfeito, boa ideia é você criar o seu blogue. Democraticamente: muito obrigado pela compreensão.